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Bem vindo ao blog Cuiqueiros, um espaço exclusivamente dedicado à cuica – instrumento musical pertencente à família dos tambores de fricção – e aos seus instrumentistas, os cuiqueiros. Sua criação e manutenção são fruto da curiosidade pessoal do músico e pesquisador Paulinho Bicolor a respeito do universo “cuiquístico” em seus mais variados aspectos. A proposta é debater sobre temas de contexto histórico, técnico e musical, e também sobre as peculiaridades deste instrumento tão característico da música brasileira e do samba, em especial. Basicamente através de textos, vídeos e músicas, pretende-se contribuir para que a cuica seja cada vez mais conhecida e admirada em todo o mundo, revelando sua graça, magia, beleza e mistério.

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quarta-feira, 11 de junho de 2014

Homenagem a Zeca da Cuica por seus 80 anos

Zeca da Cuica - Década de 1970
Zeca da Cuica, uma das maiores referências para nós cuiqueiros, completa hoje 80 anos de vida e este humilde espaço cuiquístico não poderia deixar de exaltar o Sr. Zeca nessa data tão especial. Nosso mestre se destacou desde muito jovem no ambiente das escolas de samba e desfiles de carnaval, mas deixou seu nome marcado na história da música brasileira quando passou a atuar nos estúdios de gravação, registrando sua arte em discos de inúmeros artistas dos mais variados gêneros musicais.

A sonoridade da cuica ganha uma qualidade muito especial nas mãos do Zeca, pois seu estilo reúne fundamentos desses universos musicais distintos, das baterias das escolas e rodas de samba, onde prevalecem a esponteniedade e improvisação, em contraste com a sensibilidade e profissionalismo que os estúdios de gravação exigem dos músicos.

A música a seguir tem um título que já diz tudo: Tema do Zeca da Cuica. Trata-se de uma homenagem feita pela violonista e compositora Rosinha de Valença ao seu amigo Zeca, gravada em 1976 no disco Confusão Urbana, Suburbana e Rural, de outro grande amigo do Zeca, o excepcional clarinetista Paulo Moura. Essa faixa começa com "Bicho papão", composição de Martinho da Vila, Wagner Tiso e Paulo Moura, e aos 2:17min inicia a música em homenagem ao Sr. Zeca.


Além de participar em gravações como esta, nosso homenageado também tem um longo histórico de atuação em duas escolas de samba: uma é a Estácio de Sá, antiga Unidos de São Carlos, do local onde ele mora praticamente desde que nasceu; e a outra é a Acadêmicos do Salgueiro, a primeira a lhe abrir as portas e permitir que desfilasse tocando cuica. Inclusive, foi o Sr. Djalma Sabiá - um dos fundadores do Salgueiro - quem deu ao Zeca a sua primeira "chorona".

Mas a relação do Zeca com a Estácio e o morro de São Carlos também é muito forte, e uma prova disso é o trecho contido no livro Samba, Cuica e São Carlos que apresenta este breve depoimento do ZK, como o nosso mestre gosta de ser citado:

Um dos herdeiros da virtuosidade e elegância ritmica da geração dos pioneiros é o cuiqueiro José de Oliveira, conhecido artisticamente como Zeca da Cuica, agraciado, em 21 de março de 2000, com a medalha Pedro Ernesto, concedida pela Câmara de Vereadores da Cidade do Rio de Janeiro aos cidadãos que, com seu trabalho, enaltecem a cidade. Zeca da Cuica assim se apresenta: "eu, José de Oliveira, 70 anos de idade, conhecido como Zeca da Cuica, brasileiro, casado, pai de quatro filhos, doze netos e um bisneto, membro do coral da COMLURB - Companhia Estadual de Limpeza Urbana -, há 38 anos cuiqueiro por vocação. Para ilustrar, seguem alguns nomes inesquecíveis, os quais tive o privilégio de acompanhar: mestre Candeia, Cartola, Nelson Cavaquinho, Elizeth Cardoso, Ismael Silva (fundador da primeira escola de samba do Estácio) e Carmem Costa, todos no teatro Opinião. E, ainda, Almir Guineto, Jorge Aragão, Zeca Pagodinho, João Bosco, Jovelina Pérola Negra; Rafael Rabelo, Zimbo Trio e a Orquestra Sinfônica de Curitiba, na Sala Cecília Meireles; Elis Regina, Marisa Monte, Paulinho da Viola; Gil e Caetano no disco Tropicália 2. Os mestres que me ensinaram a tocar cuica foram Ministro, Boca de Ouro, Fumanchú, Oliveira do morro de São Carlos, Germano da Cuica da Mocidade Independente de Padre Miguel e o grande mestre Marçal...".

Os Originais do Samba - Década de 1960 - Zeca sentado com a cuica

Um fato muito importante na carreira artística do Zeca, mas que não consta nesse relato, é a participação dele no grupo Os Sete Modernos do Samba, conhecido mais tarde como Os Originais do Samba, do qual Zeca é um dos fundadores. Apesar de integrar o Originais por pouco tempo, foi com este grupo que ele se destacou como exímio cuiqueiro, sendo convidado para gravar nos discos desses artistas todos que ele mesmo citou e, enfim, se firmar profissionalmente no meio musical.

Mas nesse meio tempo, devido à complicações de um glaucoma, o Sr. Zeca foi aos poucos perdendo a visão até ficar completamente cego. Consequentemente, à medida que a idade também ia avançando, os convites para gravações e shows foram diminuindo, mas sua paixão e habilidade para tocar cuica permanecem firmes. O vídeo abaixo traz o registro da homenagem feita ao Sr. Zeca durante o 10º encontro de cuiqueiros do Rio de Janeiro, realizado tradicionalmente a cada 21 de abril, o Dia da Cuica.


Toda essa postagem diz muito pouco da importância do Sr. Zeca em relação à cuica. Ainda há muito o que dizer a seu respeito e serão necessárias muitas outras publicações para dimensionar a sua grandeza como músico e ser humano. Afinal, 80 anos não são 80 dias. Parabéns, Sr. Zeca! E obrigado por tudo!
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domingo, 1 de junho de 2014

Livro: Samba, Cuíca e São Carlos

Estive no lançamento do livro Samba, Cuíca e São Carlos há pouco mais de um mês e pude conversar com o autor, Carlos Nogueira, sobre uma questão que me deixou curioso: a palavra cuíca no título da obra. Apesar de tal fato sugerir que o texto contenha algo sobre o nosso estimado instrumento musical, na verdade há pouco nesse sentido. O livro é um interessante documento sobre o Morro de São Carlos e sua importância na história do samba e do carnaval. Segundo o autor, a cuíca entra no título porque "simboliza a alma do samba e sua sonoridade mimetiza a dor daqueles que ajudaram e continuam a construir o Brasil".


Em Samba, cuíca e São Carlos, Carlos Nogueira reconstrói a memória social do Morro de São Carlos, localizado no Estácio, bairro da cidade do Rio de Janeiro onde foi fundada a primeira escola de samba, a Deixa Falar, em 1928, e lugar de resistência e afirmação da identidade afro-descendente.

Nogueira começa a frequentar o Morro de São Carlos em 1998, quando passa a conviver e colher depoimentos de seus moradores, remanescentes da escola de samba Unidos de São Carlos. O autor conversou com compositores, passistas, personagens lendários do São Carlos, como Marly do Estácio, Zacarias, Sidney Conceição, Jorge Cabo, Oliviel, Mago, Wanderley Caramba, Zeca da Cuíca e muitos outros, recompondo assim a memória de uma das favelas mais antigas da cidade e do bairro no qual se localiza.

Nesse percurso, Nogueira também aborda a diversidade étnico-cultural da cidade do Rio de Janeiro nos idos da década de 1920, as políticas de higienização do governo de então e o surgimento do samba urbano carioca. 

A importância da Praça Onze, os carnavais, o Morro de São Carlos, os enredos da Unidos de São Carlos e da Estácio de Sá são objetos deste livro, em que seu autor nos traça um precioso roteiro do processo de surgimento de um dos nossos patrimônios culturais mais valiosos – o samba.

Carlos Nogueira nasceu no Rio de Janeiro. É graduado em Letras pela UFRJ e Mestre em "Memória Social e Documento" pela UNIRIO. Autor do livro Olhar de Ifá e dos vídeos Deixa Falar: 100 anos de Ismael e Mulheres Guerreiras. Atua profissionalmente na Universidade Federal do Rio de Janeiro, na fronteira das áreas de comunicação, cultura, memória e documentação.
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