Intro

Bem vindo ao blog Cuiqueiros, um espaço exclusivamente dedicado à cuica – instrumento musical pertencente à família dos tambores de fricção – e aos seus instrumentistas, os cuiqueiros. Sua criação e manutenção são fruto da curiosidade pessoal do músico e pesquisador Paulinho Bicolor a respeito do universo “cuiquístico” em seus mais variados aspectos. A proposta é debater sobre temas de contexto histórico, técnico e musical, e também sobre as peculiaridades deste instrumento tão característico da música brasileira e do samba, em especial. Basicamente através de textos, vídeos e músicas, pretende-se contribuir para que a cuica seja cada vez mais conhecida e admirada em todo o mundo, revelando sua graça, magia, beleza e mistério.

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domingo, 26 de dezembro de 2010

Homenagem a Ovídio Brito

Essa é a última postagem de 2010 e é especial por ser em homenagem ao já saudoso Ovídio Brito. Amigos e familiares sentem a dor de sua perda e nós, seus fãs, sentiremos a falta de sua arte. Fica o nosso respeito e agradecimento a este grande cuiqueiro. 

Selecionei dois textos que ilustram muito bem o quanto Ovídio nos fará falta. Um deles está neste link do blog do Cláudio Jorge, para quem não o conhece, um compositor de mão cheia e muito amigo do Ovídio. O outro texto achei no blog do Pim, muito bacana também.

Também tive a grata oportunidade de conhecer o Ovídio e uma vez pude tocar ao seu lado. Aproveitei para fazer algumas perguntas sobre cuica e observá-lo tocando. Fiquei muito impressionado! Primeiro, pelo lindo som de sua cuica. Segundo, porque ele estava tocando com pano de chão. E terceiro, pela facilidade que ele tinha em tocar cuica e cantar ao mesmo tempo, fazendo as duas coisas maravilhosamente bem. 

Inclusive, me surpreendi ao ver que além de tocar, ele também era um excelente cantor. Naquela época ele estava prestes a gravar seu primeiro e único disco solo cantando, cujo título é Viajando com Martinho, por conter exclusivamente composições do Martinho da Vila no repertório.

A última faixa é uma versão instrumental da canção Pensando Bem. Uma ideia do próprio Ovídio em acompanhar a bela melodia dessa música com o lamento de sua cuica. João de Aquino, coautor da música, fez o arranjo e seu filho Gabriel de Aquino executou o solo no violão. Nessa faixa, o Ovídio também contou com a participação especial do Índio da Cuica, Quirininho, Neném da Cuica, do Tuca e do Zeca da Cuica, que se unem ao anfitrião durante a música. Um belo encontro de cuicas!



Segue também um vídeo com imagens da roda de samba do Ovídio e de seu parceiro Márcio Vanderley, contanto ainda com a ilustre presença de Arlindo Cruz. Essas imagens foram registradas algumas horas antes do fatídico acidente que tirou o Ovídio do nosso convívio. Vejam como ele estava feliz!



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domingo, 19 de dezembro de 2010

Música 4 - Cuica no Samba de Uma Nota Só

Essa música faz parte do disco "Mestre André e sua Bateria", gravado em 1977, tempos de glória da Mocidade Independente de Padre Miguel. Não sei o nome do cuiqueiro que fez esse registro, mas ele faz progressões e floreios muito bacanas, além de solar um trecho de um dos maiores clássicos da bossa nova: Samba de Uma Nota Só, de Tom Jobim e Newton Mendonça. Boa audição!

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

A pele

A pele utilizada na cuica é de origem animal, preferencialmente de cabrito, e é num local chamado curtume onde o couro do animal é tratado para que fique em condições de ser utilizado em diversas finalidades, inclusive para tocar cuica. Primeiro, o cabrito é abatido, a pele é extraída e os pelos são raspados. Em seguida, há o processo de curtimento com alguns produtos químicos para evitar que a pele apodreça. Feito isso, está pronta para empachar e usar no instrumento.

Matéria prima
A qualidade da pele influencia muito no som da cuica. Pele grossa, pele fina, pele com ruga, pele lisa, enfim, são nuances que cada cuiqueiro avalia para encontrar o padrão que mais lhe agrada. Já ouvi dizer que até a idade do cabrito influencia na sonoridade da pele, sendo, a dos mais velhos, melhor do que a dos cabritos abatidos ainda quando jovens.

O vídeo da última postagem começa com o rapaz pressionando o centro da pele com a ponta de uma baqueta, marcando o ponto exato onde ele depois faria a amarração do gambito. Porém, é necessário molhar a pele antes desse procedimento. A pele é muito dura em seu estado natural e para empachá-la é imprescindível que esteja amolecida. Para isso, costuma-se deixar de molho por alguns minutos, dentro de um balde cheio d’água ou algum recipiente parecido.

Quando encharcada, a pele fica muito parecida com uma massa de pizza. Essa analogia é um pouco estranha, mas no vídeo da postagem anterior é possível ver que é assim mesmo que ela fica. Depois de molhada e bem amolecida, deve-se amarrar o gambito no centro da pele e, finalmente, empachá-la no arquilho, que é um arco geralmente de madeira onde fixamos a beirada da pele, como vimos ser feito no vídeo citado.

O próximo passo é esperar que a pele fique seca. Dependendo do clima isso pode levar um ou dois dias. Mas atenção, a pele deve secar na sombra, nunca ao sol. Em seguida, com a pele totalmente seca, é só encaixar na cuica, afinar e está pronta para uso. É importante evitar o contato novamente com água depois que a pele estiver instalada na cuica. Um problema muito comum é esbarrar o pano na pele enquanto se está tocando. Sem que se perceba, aos poucos o pano umedecido vai molhando a região envolta do gambito e a pele acaba se rasgando. Para evitar que isso aconteça é recomendável colocar um pedaço de plástico ou de fita adesiva na pele, por dentro da cuica, protegendo toda a circunferência próxima ao gambito.

Nos desfiles das escolas de samba ou nos ensaios que as agremiações costumam fazer a céu aberto antes do carnaval, os cuiqueiros cobrem a pele da cuica quando chove com uma touca de banho, daquelas de plástico que usamos para não molhar o cabelo. Existem experiências bem sucedidas com pele de náilon para cuica, mas há quem diga que o resultado sonoro não é tão bom quanto o da pele de couro. No entanto, o náilon tem a vantagem de não sofrer nenhuma alteração física em contato com água, sendo, portanto, uma boa alternativa para essas situações em que esteja chovendo.

Mas a pele de couro animal é mesmo a de uso mais comum entre a maioria dos cuiqueiros. É bastante resistente, embora necessite de alguns cuidados e manutenção, podendo durar bastante tempo sem rasgar. Sobre essa questão da durabilidade da pele, outra orientação é para nunca guardar a cuica com a pele esticada, quer dizer, deve-se afrouxar a pele toda vez depois de tocar.

Encontrar pele de cuica pra comprar não é tão difícil, principalmente pra quem tem uma cuica da Gope ou da Contemporânea, por exemplo. Como essas marcas têm produção em escala industrial, é fácil encontrar a pele já pronta em lojas de instrumentos musicais. Em São Paulo, situadas à rua General Osório, ficam as lojas dessas duas marcas mencionadas, uma bem próxima da outra. E do outro lado dessa mesma rua fica a loja da Redenção, também de artigos musicais. 

No Rio de Janeiro, há várias lojas na rua da Carioca e também a fábrica da famosa marca Art Celsior, no bairro de Cordovil. E para quem mora em outras regiões fora do Rio de Janeiro ou de São Paulo, acredito que dê pra comprar pelos sites dessas lojas, ou procurar na sua cidade alguma loja de instrumentos musicais que venda ou possa encomendar pele de cuica com algum fabricante. Essas dicas servem tanto pra quem quer comprar a pele já empachada, quanto para quem procura o couro, o gambito, o arquilho, enfim, cada item separadamente para empachar a própria pele. Quanto à linha encerada, tipo de corda ideal para amarrar o gambito na pele, pode ser facilmente encontrada em armarinhos ou lojas de produtos para artesanato.

Mas, independentemente das especificações que vão do gosto pessoal de cada cuiqueiro, assim como a variação de marcas disponíveis nas lojas de música, o fato é que a pele é um item da cuica sobre o qual devemos conhecer muito bem. Fazer testes com diferentes tipos de pele, oriundas de curtumes diferentes, preparadas para diferentes fins, por exemplo: para desfilar no carnaval é conveniente utilizar uma pele mais grossa, que suporte uma afinação mais aguda. Já para gravação em estúdio, uma pele fina pode atender bem às expectativas. E por aí vai, de acordo com a curiosidade e disposição de cada cuiqueiro em querer dominar esse instrumento tão melindroso chamado cuica.

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domingo, 5 de dezembro de 2010

Vídeo 4 - Empachando uma pele de cuica

O vídeo dessa postagem é uma edição de dois outros vídeos encontrados no YouTube, cujas fontes estão relacionas mais abaixo. Ele traz imagens de um rapaz empachando uma pele de cuica. Ao assisti-lo, algumas pessoas poderão até pensar que empachar uma pele é algo relativamente fácil, mas não é bem assim. Na realidade, trata-se de um procedimento que exige muita prática para que fique bem feito.

Devido à qualidade um pouco precária desse registro, alguns detalhes essenciais do processo não estão muito evidentes, por exemplo: como se dá o famoso "nó de porco" para amarrar o gambito no couro; com que tipo de ferramenta o couro é envolvido no arquilho, que é aquele arco de madeira ou alumínio onde o couro é empachado; dentre outras questões que somente a prática nos revela. Mas, mesmo assim, é possível ter uma noção do processo como um todo e do quanto pode ser trabalhoso.

A trilha sonora é uma composição do nosso grande mestre Osvaldinho da Cuica, por sinal, muito apropriada para a ocasião. O título é “A Cuica do Maninho” que, segundo o próprio Osvaldinho, foi inspirada numa situação que realmente aconteceu com ele. Vale ressaltar os seguintes versos: você bem sabe que instrumento não se empresta, se ele quebra acaba a festa e eu vi muita festa acabar; agora, vê se fica mais esperto quando algum curioso por perto quiser na cuica tocar. Sugiro a leitura da postagem “Me empresta a sua cuica?” para complementar essas ideias.


*Fontes para edição do vídeo: How to lap a cuica head / How to lap a cuica skin part 2
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